Confira a crônica na íntegra:
Aí vem a Banda
Escrito por Irmão Bonifácio – Crônica extraída do livro Carmo, 80 anos – Crônicas volume 2 (1988), páginas 77 a 79 - Gráfica da Universidade de Caxias do Sul - UCS.
“Nem tudo que ronca é cuíca; pode ser uma banda.”
— Maleiro Bandeira —
Os festejos do Cinquentenário do Carmo foram deveras marcantes em 1958. O acontecimento de maior relevo foi, sem dúvida, o lançamento da pedra fundamental do novo colégio La Salle, de São Pelegrino.
Aquele ano foi também marcado pela visita a Caxias de Giovanni Gronchi, Presidente da Itália. O governante foi homenageado em frente ao Monumento ao Imigrante por numeroso coral constituído de várias entidades, entre as quais um grupo de alunos do Carmo. Nessa ocasião entregou-se ao Presidente um enorme pergaminho desenhado pelo presente cronista, o qual, até hoje, não recebeu um obrigado pelo serviço prestado.
No mesmo ano, inaugurou-se em Boqueirão (Criúva) a escola municipal La Salle, a escola Municipal Irmão Maurício em Santa Lúcia do Piaí e a escola Irmão Martinho perto da ponte do rio São Marcos, na BR 116.
A visita do Superior Geral da Congregação Lassalista, Irmão Nicet Joseph marcou as comemorações do cinquentenário.
Todas essas e mais outras comemorações foram obscurecidas por uma nuvem azul, vermelha e branca que se avizinhava ruidosa e festiva: a Banda Marcial do Carmo.
Uma visita da Banda Marcial do Gonzaga de Pelotas a Caxias contagiou os alunos do Carmo que exigiram uma igual. O mesmo entusiasmo apoderou-se de grande número de ex-alunos do Carmo que se declararam dispostos a colaborar na organização e na manutenção da Banda.
Foi uma febre aguda tomando conta dos alunos. Em pouco mais de uma semana, mais de 180 estavam inscritos. Tudo parecia fácil e ninguém calculava as dificuldades incríveis que a manutenção duma banda desse feitio poderiam ocasionar ao colégio e à equipe responsável por ela. Todos inicialmente achavam tudo fácil. Chegou-se mesmo a realizar quatro noites seguidas de bailes no Guarani, mas o lucro auferido não deu para pagar nem 20% do valor do instrumental novo encomendado na fábrica do Valcareggio, de Porto Alegre. As listas de donativos que percorriam o Comércio e a Indústria ficaram encalhadas.
Apesar de todos os percalços, contratou-se um sargento Laudelino Policarpo Rocha, cedido pela banda dos Fuzileiros Navais do Rio de Janeiro e mais o aluno Erni La Vega do Gonzaga de Pelotas, os quais submeteram a rapaziada do Carmo a ensaios diários a partir de 5 de agosto.
Muito trabalho deu corrigir os passinhos de menininha da antiga charanga, 145 passinhos por minuto, e baixá-los ao ritmo da marcha germânica de 118 passos.
Uniformes coloridos e elegantes foram confeccionados.
A barulheira dos ensaios e os gritos de comando eram de endoidar.
No dia 5 de setembro, a Banda estava em ponto de bala para sua primeira apresentação no estádio do Juventude. O ex-aluno Ary Zatti Oliva entregou-a ao povo de Caxias, e D. Benedito Zorzi deu-lhe a bênção solene.
O Carmo ainda não tinha meninas, porém, mesmo assim, os 180 componentes da banda, cada um teve sua madrinha para lhe conferir os distintivos.
Seguiram-se muitos pedidos de apresentações, até mesmo para puxar circo, mas ninguém se dispunha a pagar os gastos, de acordo com o velho ditado: “Terminada a festa, músicos a pê. ”
No dia 31 de outubro, deu-se o maior estouro quando a Rádio Difusora de Porto Alegre promoveu um concurso de bandas marciais que se realizou no Estádio Olímpico do Grêmio. Devido ao favoritismo das bandas do Gonzaga e do Colégio das Dores; várias outras desistiram do concurso tais como as do Rosário e do Júlio de Castilhos.
O Carmo suplantou as outras concorrentes devido a seu entusiasmo e à vibração dos componentes. Sagrou-se campeã, recebeu três Delas taças e mais um artístico diploma.
Regressou a Caxias à meia noite e encontrou a cidade em peso aguardando nas ruas e na praça. Teve que desfilar em triunfo em Caxias assim como também fizera na Avenida Borges de Medeiros em P. Alegre.
Daí em diante, a Banda marcou presença alegre em centenas de acontecimentos festivos durante os seus vinte anos de existência: Festas da Uva, desfiles cívicos, acontecimentos sociais, competições esportivas, concursos de bandas marciais em São Paulo, excursões para Lajes, Bom Jesus, Lagoa Vermelha, Novo Hamburgo, Bento Gonçalves e outros municípios vizinhos, várias ao Uruguai etc.
Pela Banda Marcial muito trabalharam os Irmãos Inácio, Ramiro, Florentino, Benildo Amadeo, José, Bonifácio, sem falar do grande regente maestro Gama, o Jaime, o Dal'Agno, o Sartori, o Maggi, o Focchesatto, o Madalena, o Renato, o Olímpio, o Mirco e mais uma centena de outros que deram seu tempo para conduzir a Banda a seus inúmeros triunfos. Uma comissão de mães, de balizas e treinadores sempre se fizeram presentes mesmo nas horas mais difíceis.
Grandiosos acontecimentos sociais foram os bailes anuais de aniversário nos grandes clubes da cidade.
Como toda instituição a Banda teve seus altos e baixos. O número de componentes foi diminuindo e cada dia ficava mais difícil angariar novos elementos em substituição dos desistentes. De 180 ficou reduzida a 80 que, em grande parte, não eram alunos do Carmo.
As despesas com: treinos, com a conservação e reposição do instrumental e transporte aos locais de apresentação tornaram-se elevadas e mesmo proibitivas.
Lentamente veio o declínio, e várias tentativas de injetar mais ânimo e mesmo a ideia de formar banda mista, não surtiram efeito.
No vigésimo aniversário de sua gloriosa existência encerrou definitivamente suas atividades.
Muitos ainda lastimam a ausência da Banda e gostariam de que ela fosse reerguida das cinzas. Um consolo tem seus antigos componentes e colaboradores abnegados: realizaram algo que deixou saudade.
Lá se foi a BANDA!...